terça-feira, 6 de abril de 2010

Casos e notas.

Como profissional de educação inclusiva deparei-me com alguns dilemas característicos da atuação em escolas e sistemas de ensino. Os problemas mentais são os de mais difícil resolução e são os que nos remetem a conflitos pessoais, sociais, de relacionamentos e de interpretações de forma geral. Saber lidar com isso no trabalho, na vida familiar e na vida escolar me parece hoje o desafio de Hércules. O artigo a seguir nos da uma ideia de como conflitos podem ser avaliados por divergentes olhares. Olhos que veem as reais ações por traz dos fatos. Em nosso estudo este texto nos serve pra analisar sintomas mentais em homeopatia, bem como e usado em filosofia clinica para reforçar a historia de vida do partilhante. Como reflexão social temos um mundo de análises que podemos fazer; nas nossas relações com o outro, com os sistemas de saúde, com as nossas visões de mundo e de noções de problemas.
Assim os convido a esta leitura.

Saúde Quando o amor de pai já não basta



NUNCA É DEMAIS "Se eu não estiver sempre ao lado de
meu filho, aí, sim, Mike ficará de fato muito doente", diz Earley
O escritor americano Pete Earley, de 57 anos, é especialista no sistema judiciário de seu país. De seus doze livros, o último é inspirado em uma experiência pessoal. Recém-lançado no Brasil, Loucura, a Busca de um Pai pelo Insano Sistema de Saúde (Artmed; 375 páginas) traz a história de seu filho Mike, portador de transtorno bipolar. Além do relato sensível de um pai diante da doença de um filho, Earley faz críticas ao modo como as leis americanas tratam os doentes mentais. Por causa de uma reforma ocorrida nos anos 60, dezenas de milhares de leitos psiquiátricos deixaram de existir e a maioria dos doentes ficou sem a alternativa do tratamento hospitalar – situação pela qual também passam os brasileiros. A convite do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, Earley participou, na semana passada, de uma série de debates sobre o assunto. Antes de embarcar para o Brasil, ele falou à repórter Adriana Dias Lopes, de sua casa em Fairfax, no estado da Virgínia.

O DIAGNÓSTICO Os primeiros sintomas surgiram em 2000, quando Mike tinha 22 anos e estudava pintura na escola de artes do Pratt Institute, em Nova York. Num fim de semana, ele me ligou para dizer que tinha levado cinco mendigos ao McDonald’s porque queria conversar com eles. Logo depois, Mike falou que não tinha certeza se de fato havia feito aquilo ou apenas sonhado. Levei-o ao psiquiatra. Foi então que ouvi do médico que, se eu fosse um sujeito de sorte, Mike estaria usando drogas. Fiquei chocado com aquelas palavras. Mas hoje as entendo perfeitamente. Naquele momento, não sabia nada sobre doenças mentais e como elas podem ser cruéis.

A PRIMEIRA PRISÃO Após o episódio do McDonald’s, Mike foi a mais duas consultas psiquiátricas, mas depois desistiu. Disse que não era louco e que apenas precisava se alimentar melhor. Ele me parecia bem e, naquele momento, não me dei conta da gravidade do problema. Durante nove meses, chegamos até a pensar que a história do McDonald’s tinha sido uma casualidade qualquer. No entanto, certo dia, Mike teve um surto gravíssimo. Ele invadiu uma casa quando não havia ninguém, foi até o banheiro e tomou um banho de espuma. Os donos do imóvel infelizmente decidiram processá-lo, mesmo sabendo que se tratava de um doente mental em surto. Eles insistiram em acusá-lo como autor de um delito grave. Tudo pareceu ser desgraçadamente injusto naquele momento. A acusação poderia marcá-lo para sempre como um criminoso e teria sérias repercussões, atrapalhando sua vida profissional. Uma policial conseguiu convencer o casal a amenizar a acusação. Um ano depois da absolvição do meu filho, essa policial foi morta por um jovem de 18 anos, vítima de problemas mentais.

NENHUM CUIDADO É EXCESSIVO Até hoje me aconselham a não insistir para que meu filho se cuide. Muitos acreditam que, se eu deixá-lo bater cabeça, Mike finalmente entenderá que tem de seguir o tratamento de forma regular. Essas pessoas não percebem que "bater cabeça", no caso do meu filho, pode significar o suicídio – 40% dos bipolares tentam se matar. O paciente acredita realmente que pode ficar bem sem medicação – essa é outra característica da doença. Se eu não estiver sempre ao seu lado, aí, sim, Mike ficará de fato muito doente. Será que essas pessoas falariam algo semelhante se ele fosse portador de síndrome de Down, por exemplo? Os pais de uma criança com Down nunca são criticados por advogar por seu filho. E tanto Down quanto transtorno bipolar são distúrbios cerebrais. Em relação aos doentes mentais, nenhum cuidado é excessivo. Meu filho tem uma doença. Uma doença que afeta seu cérebro e rouba sua capacidade de decisão.

O SOFRIMENTO MAIOR A pior coisa para um pai ou para uma mãe é não poder resolver o problema de um filho. Como pais, estamos habituados a amar e proteger nossas crianças. Mas, quando uma delas tem um transtorno mental, nosso amor não é mais suficiente. Já senti raiva, já senti frustração e já chorei por causa de Mike. É horrível olhar para o rosto de meu filho e perceber que, nos momentos de crise, é como se eu não fosse seu pai.

PUNIÇÃO E TRATAMENTO Não há nada de humanitário em impedir que um paciente seja tratado contra sua própria vontade, a menos que ele represente um risco para outra pessoa. Dessa forma, a lei pune meu filho em vez de ajudá-lo. O sistema de saúde americano diz que não há nada a ser feito até que meu filho se torne perigoso. Ao mesmo tempo, o sistema penal determina que, se ele se tornar perigoso, poderá prendê-lo. É preciso entender definitivamente uma questão elementar sobre doenças mentais: elas roubam das pessoas a capacidade de tomar decisões inteligentes. O mais frustrante nessa história toda é que sabemos como ajudar esses doentes. Cerca de 70% deles se beneficiam da medicação disponível. Mas, com as leis atuais, em vez de lhes dar ferramentas para que levem uma vida razoavelmente normal, eles são acusados de preguiçosos, viciados, bêbados ou vagabundos. Prefere-se culpá-los a ajudá-los.

O SISTEMA DE SAÚDE IDEAL Nos Estados Unidos, ninguém pode ser mantido confinado involuntariamente por mais de 72 horas sem ter o direito de comparecer perante um juiz com um advogado, à exceção dos autores de delitos extremamente graves, como assassinato. Nessa audiência, o juiz decide se a pessoa deve ou não ser levada a um hospital contra a própria vontade. Os tribunais americanos entendem, por exemplo, que um esquizofrênico que come seu próprio excremento não pode ser detido em um hospital porque comer fezes não é um ato perigoso. Do meu ponto de vista, o correto seria que o tribunal nomeasse três psiquiatras sem relação com o paciente para que eles opinassem sobre a necessidade ou não de internação. Meu filho acredita que o ex-presidente George W. Bush estava por trás dos atentados de 11 de setembro em Nova York. Essa é a sua opinião política com a qual posso não concordar. Mas, quando ele me diz que pode voar ou que não sou seu pai, está claro que é doente e precisa de ajuda.

O FUTURO Mike estava indo bem quando publiquei o livro, em 2006. Mas há pouco mais de um ano ele teve duas crises graves. Tal como ocorreu em tantas outras ocasiões, havia parado de tomar a medicação. Numa das vezes, ficou com medo de que eu chamasse a polícia e saiu de casa. Foi dirigindo da Virgínia até a Carolina do Norte (270 quilômetros de distância). No meio do caminho, ele me ligou dizendo que ouvia vozes que lhe garantiam que morreria se saísse do carro. Mike se recusava a falar onde estava. Consegui convencê-lo a voltar para casa e tomar os remédios. No caso do meu filho, os medicamentos levam três semanas para começar a fazer efeito. Pouco tempo depois do episódio do carro, ele teve outra crise. Mike saiu de casa nu e foi pego pela polícia mais uma vez. Quero o que todo pai quer para seu filho: um bom trabalho, uma família e felicidade. Mas tudo isso é difícil para Mike. Ele está sem trabalho, não é casado e tem poucos amigos. Minha prioridade é mantê-lo bem. Mike tem sorte, porque tem irmãos que cuidarão dele quando eu e sua mãe não estivermos mais aqui.

fonte:http://veja.abril.com.br/130509/p_108.shtml

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